
Paralisado pelo toque amargo do café deixo deslizar das mãos a pálida chávena já fria.
Observo-a cair.
Mil pedaços espalham-se nervosamente pelo chão, e a cafeína jorrando que nem sangue mistura-se com o pó da gente que outrora ali passou.
O barulho desperta-me, o tilintar nervoso dos cacos desvia-me o olhar e por um momento esqueço a agitação da chuva que lá fora cai incessante.
Olho agora as minhas mãos trémulas e frias, por um instante nada mais existe.
- Está tudo bem?
Uma doce voz rompe que nem um trovão o mundo onde por momentos viajo.
Sobressaltado levanto os olhos, percorro um avental branco nuvem até uma blusa azul céu. Um rosto calmo olha-me fixamente, perco-me na profundidade daqueles olhos negros marcados pelo cansaço de uma vida dura, mas que mesmo assim me aquecem como um sol.
- Sim, sim…desculpe.
Levanto-me atrapalhado deixando sobre a mesa o dinheiro de um café e da chávena estilhaçada. Sem porquê dirijo-me até à porta, olho uma última vez aquele rosto acolhedor e num breve momento de cumplicidade trocamos sorrisos enquanto saio.